Enquanto as cabeças da população estavam afundadas nos travesseiros… | Foto: Ramiro Furquim / Sul21
Há dois pontos que demonstram a péssima condução que a prefeitura deu para os cortes das árvores nas proximidades do Gasômetro. O primeiro foi ocorreu em 6 de fevereiro, quando aconteceram os primeiros cortes de árvores e foram ouvidos os primeiros protestos. Estes surpreenderam tanto o prefeito Fortunati que ele soltou uma das suas mais mal ensaiadas e infelizes declarações: “As pessoas não utilizam as árvores no Gasômetro”. Outro ponto pode ser escolhido dentre as fotografias das árvores abatidas em plena noite — pois, de forma absolutamente sorrateira, escondida da população, o horário escolhido para os cortes foi as 3 da madrugada — , mas coloco-o em outra declaração, a do procurador-geral do Município, João Batista Linck Figueira (PSDB), que disse: ”A decisão pelo corte foi conjunta. Partiu da prefeitura, mas quem encaminhou o momento mais adequado e as questões de segurança é a Brigada Militar”.
Sim, meu caro, a decisão foi conjunta entre a Prefeitura e a Brigada. Ou seja, foi totalmente desconjunta. Desde o início, houve uma total desconsideração pelos movimentos sociais. Há 40 dias existia um acampamento protegendo as árvores e o prefeito jamais tentou um diálogo decente com eles. Foi lá e saiu dizendo chorosamente que “eles têm uma posição radical”. Isto é política? Com efeito, uns vão dizer que o acampamento era habitado por ecochatos radicais. Outros dirão que a prefeitura tinha planos que nunca conjeturou alterar. Logicamente, cada um dos lados ganhou força em função da existência do outro, mas não podemos esquecer que quem tomou o primeiro passo foi a prefeitura.
Fortunati e sua administração estão ancorados nos 65% de votos alcançados nas eleições de outubro passado. Talvez pensem que tal fato lhes dê uma espécie precedência divina, a qual lhes permite administrar a cidade do modo como lhes aprouver. A derrota na questão do aumento das passagens parece ter sido absorvida da pior forma possível e, em vez de passar a privilegiar o diálogo, a prefeitura escolheu como parceira a força policial, usando a falsa prerrogativa da popularidade eleitoral.
A ação às 3 da madrugada diz tudo: a prefeitura quis pegar os manifestantes durante o sono; ela teve medo da reação popular que veria a ação acordada, à luz do dia; o horário impediu que os jornais impressos de hoje (não acredito que o fizessem, mas…) estampassem fotos e amanhã, se elas saírem, já será feriadão… Enfim, tudo leva a crer numa ação pusilânime, realizada na calada da noite. Tudo foi planejado como se fosse um crime. Tudo foi feito no horário preferencial dos ladrões, a madrugada. Tudo foi feito para que a população não visse a ação, como se esta, a ação, fosse anônima. Sugiro que Fortunati também passe a usar este horário para seus eventos e inaugurações.
Ouvi o argumento de que as árvores não eram nativas, mas plantadas em outras gestões. Fiquei pensando na diferença entre umas e outras quando minha amiga Carol Bensimon veio com um contra-argumento mortal: “Essas mesmas árvores ‘exóticas’, as tipuanas, são as árvores protegidas em tantos túneis verdes da cidade, como o da Gonçalo de Carvalho (responsável, aliás, pelo título que essa rua ganhou de ‘mais bonita do mundo’)”.
Como escreveu Igor Natusch no Facebook, tombam abatidas as árvores mas não apenas isso — tomba abatido o diálogo, entrando em seu lugar a cisão com os movimentos sociais. Agora, sabemos que nossos administradores se escondem à noite, agindo como ladrões. E, podem acreditar, o precedente não será esquecido.
P.S. — E tudo foi feito pelo vice-prefeito, de forma a proteger Fortunati. Ou seja, o prefeito — que está em Nova Iorque — mandou fazer e ficou lá longe, observando, sem se “desgastar”.
E a coisa continua na manhã chuvosa de hoje… | Foto: Bernardo Ribeiro / Sul21
… com a via interrompida | Foto: Bernardo Ribeiro / Sul21
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