Ronald Freitas, membro do Comitê Central do PCdoB, fez uma lúcida intervenção sobre a realidade política do nosso país, na última reunião do CC ocorrida entre os dias 14 a 16 de agosto. Além de uma reflexão do quadro político e do papel das instituições basilares da República, o amigo Freitas, ressalta caminhos para o enfrentamento da crise política. Vale a pena a Leitura.
Notas sobre a intervenção na reunião do Comitê Central do PCdoB
Ronald Freitas*
Vivemos em nosso país, nos dias que correm, uma crise capitalista (interna e externa), e uma crise do projeto político que se iniciou com a vitória de Lula em 2002.
Nossos documentos e resoluções têm fundamentado vários aspectos da crise sistêmica do capitalismo, seja na sua manifestação geral, mundial, seja na sua manifestação nacional.
Já a crise que enfrenta o projeto iniciado pelo governo Lula e continuado por Dilma, embora tenha sido objeto, por nós, de repetidas analises e proposições de ações políticas, voltadas para superar a ofensiva conservadora e fazer avançar o nosso projeto, não temos conseguido êxito nesse intento e a crise do governo Dilma tem se agravado continuamente. O governo tem colhido seguidas derrotas no parlamento, nas esferas do judiciário, e mesmo junto os movimentos sociais.
Creio que a crise em que vive o ciclo dos governos Lula e Dilma, ainda está a merecer de nossa parte, uma compreensão mais acurada e multilateral de suas causas e características, para que possamos buscar posicionamentos mais adequados à ação partidária nesse terreno.
As propostas de constituição de uma ampla frente política, que defenda a democracia, e nos faça retomar a iniciativa política, tem esbarrado, numa realidade de correlação de forças políticas que não tem favorecido a esse tipo de proposição.
O enfraquecimento do poder executivo, que permite uma forte fragmentação do poder central do estado e em decorrência, um desequilíbrio entre os três poderes básicos do Estado: Executivo, Legislativo e Judiciário. Um congresso nacional hegemonizado por forças conservadoras primarias. Uma atuação altamente politizada e no essencial conservadora, do Poder Judiciário, com destaque para a mais alta corte do país, o Supremo Tribunal Federal. A emergência e autoafirmação de poderes emanados ou fortalecidos pela constituição de 1988, como MP (Federal, Estaduais e municipais); Controladorias Gerais; Tribunais de Contas; e mesmo órgãos constitucionalmente subordinados ao poder executivo como: PF, Ibama e Agências Reguladoras, que cada vez mais atuam de forma autônoma. O desenrolar de uma crise econômica, que leva o governo a ter que tomar medidas que se chocam com interesses fundamentais de sua base social, gerando fortes insatisfações nela, que se manifestam em apoio relativo ao executivo nesse momento. A amplificação intensa de fatos desenrolados em torno da chamada “operação Lava Jato”. Alguns erros de procedimento e condução política, por parte do governo. Junto com uma vitória política apertada quando da eleição de Dilma a presidência, criaram as condições suficientes e necessárias para que as oposições parlamentares e partidárias, com forte respaldo na mídia conservadora, nas elites econômicas empresariais, principalmente a do mercado financeiro, e nos círculos reacionários da sociedade, deflagrassem um forte movimento golpista, cujo objetivo central é inviabilizar o governo Dilma, destruir a liderança de Lula, fragilizar o PT, e retomar o controle do aparato do estado nacional, pondo-o, como sempre foi ao seu serviço.
Diante desse quadro, creio que o esforço que as forças progressistas e populares têm desenvolvido, seja na atuação parlamentar, seja nas mobilizações dos movimentos sociais tem surtido pouco efeito. Temos sofrido derrotas em cima de derrotas, sem que as manobras parlamentares que tentaram desativá-las fossem exitosas, sem que as mobilizações sociais voltadas a barrá-las tenham alcançado densidade suficiente para impedi-las. Creio que se faz necessário aprofundarmos nossas orientações táticas e políticas, a fim de avançarmos nessa resistência.
A nossa atuação política, termina sendo absorvida pelo imediatismo dessa conjuntura de crise que reflete a realidade imediata de agravamento da crise econômica, da agressividade das oposições, de um congresso com baixa categoria, que se limita ao jogo do “toma lá dá cá”. Diante disso, lançamos o apelo que se forme uma ampla frente política em defesa da democracia e do Governo Dilma. Orientação justa e necessária, mas que tem encontrado pouco eco nas forças progressistas da sociedade. Estas, em sua maioria, estão preocupadas em defender aspectos particulares de seus interesses, e que pautam sua atuação a margem de um plano político, que tenha a construção do Brasil, como uma Nação soberana, democrática e socialmente justa, como norte e foco de atuação.
Considero necessário, em complemento e fortalecimento, do trabalho de defesa das nossas posições nas frentes onde atuamos, passarmos a denunciar a profunda crise de organização do Estado Nacional Brasileiro, que vai se caracterizando por uma descaracterização dos papeis relativos dos poderes da república, com a fragilização do executivo, da hipertrofia política do judiciário, do reacionário protagonismo do legislativo, e com a emergência de outros centros de poder, que derivado de interesses corporativos e/ou motivados em falso moralismo, se consideram, redentores da Pátria, refundadores da Republica etc., mas que em realidade não passam de marionetes, conscientes ou não desse papel, das elites tradicionais, em seu desiderato de derrotar o ciclo político iniciado, em 2002, com a vitória de Lula.
Diante disso, vejo como necessário que camaradas nossos que detêm mandados parlamentares, executivos e outros, e que sejam lideranças dos movimentos sociais, venham a público em defesa concreta, do governo Dilma, mas também contra as arbitrariedades e inconstitucionalidades que em nome da justiça se praticam, particularmente na esfera da Operação Lava Jato, mas também em outras esferas de poder, como na atuação momentânea do TCU, com relação das contas do governo Dilma.
Denunciarmos, a atividade antinacional e antiprogresso, de certos órgãos da república, que, com um comportamento burocrático, entravam o andamento de obras de grande relevância para o desenvolvimento de nosso país, como hidroelétricas, estradas, aeroportos, etc.
Procurarmos criar as condições políticas e legais, para que diferentes esferas do poder atuem de forma sinérgica e não antagônica, nas análises e deliberações de projetos de interesse nacional.
Chama a atenção que diante dos reiterados vazamentos da operação lava jato, o máximo que elevadas autoridades do governo e do PT conseguem falar à guisa de denúncia, é que falta isonomia nos vazamentos. Até que ponto isso é ingenuidade politica, ou não passa de grosseiro erro político, que na pratica, consiste em abdicar do dever de governar o Brasil de acordo com a delegação da maioria de seu povo. Obvio que vivemos numa situação de correlação de forças interna e externa que nos impõe duros limites de governabilidade, do que decorre a vital necessidade de ampliarmos ao máximo o leque de alianças para poder levar o governo a bom termo. Mas, muito diferente é perder o controle dos órgãos governamentais subordinados ao poder executivo, ou se tornar refém de outros poderes da república, em nome de uma difusa e liberal forma republicana de governar. Ou, o que é também muito grave, enclausurar-se em palácio, enquanto as oposições se tornam agressivas.
Isso e necessário mudar, sobre pena de quem mudará é o governo.
A necessidade de reverter esse quadro de imobilismo político e administrativo em que vive o país e o governo, é de alcance estratégico, e condição para podermos reverter a onda de pessimismo em que vivemos.
E essa é sem dúvida uma trincheira de luta, irrecusável para os comunistas.
São Paulo, 16/08/2015
*Ronald Freitas é membro do Comitê Central do PCdoB
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