Qual a relação existente entre os princípios da modernidade e a educação como acontece hoje, na realidade contemporânea?
Por Luiz Müller*
É na modernidade que começa a se estruturar a escola que daria embasamento e sustentação para a burguesia como classe dirigente no mundo. O Racionalismo de Descartes pavimenta o caminho da burguesia. As leis naturais, invariáveis e independentes da ação do homem estruturam também a pirâmide social. Pirâmide Social que precisa ser sustentada através do conhecimento transmitido dentro das escolas. Pautado pelo realismo de René Descartes, Comênio escreve a Didática Magna, o método pedagógico que ao invés de ensinar palavras e sombras, passa a ensinar ” o conhecimento das coisas”. Já Jonh Locke mostra que aos homens que vão trabalhar nas fábricas não interessa saber das coisas da humanidade. Interessa que saibam mecânica e cálculo. Só as elites tem acessos as ciências sociais e o conhecimento das “humanidades”. Nas palavras de Moacir Gadotti, “aceitava-se facilmente a divisão entre o trabalho intelectual e o trabalho manual.” Então, para as classes inferiores que tivessem algum acesso a educação, era lhes dado o conhecimento técnico necessário para melhor desempenharem as funções que lhes eram atribuídas de trabalho na sociedade. Já para as classes dominantes a formação mais geral e humanista. A estrutura que Comênio sinaliza para a organização escolar é similar a existente nos dias de hoje. Da mesma forma que na modernidade, a escola contemporânea destaca o ensino da técnica em detrimento das ciências humanas. Mas como o acesso a academia só é dada as classes dominantes e só na academia há o desenvolvimento da pesquisa, automaticamente as escolas técnicas só servem para “passar adiante” o conhecimento produzido na academia. Formam-se assim, trabalhadores com qualificação técnica. Com o desenvolvimento do ensino público e gratuito, cada vez mais as classes “inferiores” da pirâmide social tem acesso a esta escola. Há abundância de trabalhadores qualificados para uma quantidade cada vez menor de postos de trabalho. Mantem-se assim a lógica burguesa: Ter mão de obra em quantidade e cada vez mais qualificada para poder continuar sendo manipulada por salários aviltantes. A escola de hoje, sem cadeiras como filosofia, sociologia, artes, etc… é uma escola que não forma cidadãos plenos. A individualidade preconizada pela burguesia só vale para os da sua própria classe. Às classes inferiores sobra a uniformização do ensino técnico científico passado a conta gotas e de maneira fragmentada para diferentes parcelas da classe. O conhecimento antes acumulado nas academias hoje tem proprietários privados que só o liberam na medida em que se capitalizam e acumulam cada vez mais recursos em detrimento das classes que frequentam as escolas médias.
Metodologia e disciplina são a melhor forma para o aprendizado?
O tema Ordem e Progresso, notadamente positivista, que decora a bandeira nacional, propiciou um pequeno diálogo a saída da aula de Sábado, entre mim e uma colega que estava fazendo o seu trabalho. Para ela, ordem é sinônimo de planejamento e para ter planejamento é preciso ter um método. Então, consequentemente pela ordem se chega ao progresso. Palavras e pensamentos que mostram claramente que também na pedagogia a linguagem expressa conceitos pré estabelecidos e impostos pelas classes dominantes. O planejamento de um professor é feito para lecionar uma “disciplina” e não uma “cadeira”. O método da escola burguesa visa formar o “cidadão disciplinado” . Disciplina é aceitar a ordem instituída pois ela é fruto de leis naturais e invariáveis, não dependendo da ação e muito menos da vontade do homem. É interessante verificar o que diz o dicionário Luft sobre o termo : “disciplina. Ramo do conhecimento, matéria do ensino. Procedimento conveniente ou ordem requerida para o bom funcionamento de uma organização. Regra, Método. Submissão a um regulamento. Instrumento de flagelação usado por frades ou devotos”. Submissão, flagelação, ordem requerida, são termos aos quais não nos sujeitaríamos de maneira nenhuma se nos fossem impostos assim, no sentido estrito da palavra. No entanto, através de um processo de manipulação da linguagem não só a maioria se submete mas aplica tais atrocidades contra alunos indefesos que tem outra linguagem e processos(métodos) de aprendizado próprios. Para evitar a submissão a conceitos pré estabelecidos é preciso questionar se há apenas um método. Ordem significa disciplina, disciplina significa submissão e flagelação. Serão então a disciplina e a ordem fundamentais para o processo de ensino aprendizagem, se não há dois indivíduos exatamente iguais, conforme nos mostra a própria ciência racionalista? Que progresso é este que se impõe através da submissão a um regulamento pré estabelecido? E para quem ele serve?
Bibliografia:
Gadotti, Moacir, História das idéias Pedagógicas, Editora Ática, S.P. , 2001
Löwy, Michael. Ideologias e Ciência Social, Positivismo, Editora Cortêz, S.P., 1999
Luft, Celso Pedro. Mini dicionário Luft, 6ª edição, Editora Ática e Editora Scipione, SP,
*Luiz Müller, autor do Blog é autor do texto
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