Reblogado do Do Pataxó Cartuns
Você pode imaginar um juiz britânico – Leveson, por exemplo, o que conduziu as discussões para a regulação da mídia no Reino Unido – numa festa de um magnata da mídia como Rupert Murdoch?
A resposta cabe em três palavras: não, não e não.
Mídia e Justiça devem fiscalizar uma à outra, numa sociedade séria e adulta. Não podem se dar tapinhas nas costas e confraternizar como velhos camaradas.
Que a Globo ignora esse princípio vital da democracia é óbvio. Cenas constrangedoras, no calor do Mensalão, reuniram juízes do STF e jornalísticos icônicos da Globo.
Que o juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, não sabia disso é um fato novo, ainda que não surpreendente num país de Justiça partidária como o Brasil.
Num mundo menos imperfeito, Moro teria recusado um prêmio da Globo. Polidamente, assim como um jornalista rejeita um presente caro.
Mas Moro não resistiu, e as imagens dele na premiação são lastimáveis. A posteridade haverá de olhá-las como símbolo de um tempo de atraso no Brasil.
Não há almoço de graça, e nem prêmio. Uma organização como a Globo não premia ninguém sem que haja interesses por trás.
Do ponto de vista prático, o que se deve esperar de alguma causa jurídica que envolva a Globo e que acabe caindo nas mãos de Moro?
A aceitação da homenagem já foi um ruim. Mas as palavras de Moro – e o olhar deslumbrado traído pelas fotos da cerimônia – tornaram as coisas ainda piores.
Moro, segundo o site do Globo, disse ter ficado “particularmente tocado” com os protestos de domingo.
Visto que foram protestos em que Dilma foi massacrada, a declaração de Moro não poderia ser mais reveladora.
Mais que isso, só se ele dissesse que tem andado batendo panela.
Como Joaquim Barbosa antes, Moro já se tornou o herói não dos brasileiros – mas da direita nacional.
Também como Joaquim Barbosa antes, a Globo já tratou de armar a gaiola para ele.
Entre sorrisos, na premiação, Moro entrou nela – para prejuízo da sociedade.
Autor: Fernando Brito
24 de janeiro de 2015 | 08:22
É inacreditável a alegria pelo “bom negócio” feito pelo doleiro Alberto Youssef, segundo as declarações de seu advogado tucano hoje na Folha. Já havíamos ficado sabendo que o acordo de delação restringe a pena de Youssef a três anos em regime aberto. E que ele vai conservar parte do patrimônio adquirido com o seu papel de “lavador” das roubalheiras de Paulo Roberto Costa.
Agora, graças aos repórteres Mario Cesar Carvalho e Gabriela Terenzi, ficamos sabendo que ele vai ganhar “comissão” sobre o dinheiro roubado, num valor que pode chegar a R$ 10 milhões, uma quantia impensável para nós, mortais comuns e honestos, mesmo depois de uma longa vida de trabalho duro.
O advogado Figueiredo Basto comemora: diz ele que a ” delação premiada” contém a noção de que o criminoso “vai ganhar algum prêmio no final do processo”.
O prêmio, claro, na visão dele, deve ir além de uma pena menor.
É em dinheiro, mesmo.
No caso, em dinheiro público surrupiado nas negociatas.
Imagine: você rouba um banco, é preso. Aí, negocia entregar seus cúmplices. E também os não-cúmplices que, do jeito que são a Justiça e a mídia brasileira, passam a ter de “provar” que não roubaram.
A polícia vai atrás do dinheiro e você, depois de um pequeno castigo, recebe uma mala de dinheiro – os tais R$ 10 milhões – e é mandado embora, com um “muito obrigado”….
No caso de Youssef, com o agravante de que já negociou um acordo de delação e continuou a roubar, nas barbas do juiz Sérgio Moro, porque Youssef prometeu a ele que, depois de operar criminosamente dinheiro do Banestado, do Governo do Paraná, iria parar de roubar. Não parou.
Note-se, também, a cara-dura do Ministério Público de dispor do dinheiro que vier a ser recuperado para o pagamento de comissões ao ladrão.
Quem sabe o MP não resolve estender a “promoção” para seus demais delatores. Vai ser uma festa. Todo mundo saindo livre e ainda com uma “mala” de dinheiro bem lavado.
Se o acordo com Youssef for assim, é difícil crer que se queira “restaurar a moralidade”.
Não se pode fazer isso com a imoralidade desta corrupção legalizada e referendada pelo Judiciário, como a que se propõe para o doleiro ladrão.
20/03/2015
Por Anna Beatriz Anjos e Glauco Faria
Governador compareceu ao evento de premiação da Alstom, acusada de integrar cartel de trens e metrôs de São Paulo e de pagar propinas para burlar licitação do setor de energia
Na noite da última terça-feira (17), a Revista Ferroviária realizou a 15ª edição de sua premiação anual. Em sete categorias, contemplou diversas empresas ligadas ao setor metroferroviário.
Entre elas, estava a francesa Alstom, uma das envolvidas no esquema do “Trensalão”, que, de acordo com o Ministério Público paulista, superfaturou R$ 835 milhões em contratos com o estado de São Paulo entre 1998 e 2008 – período de governo dos tucanos Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin. A Alstom também é acusada de ter pago propina de R$ 23,3 milhões, entre 1998 e 2003, a fim de burlar uma licitação para a compra de equipamentos da EPTE (Empresa Paulista de Transmissão de Energia), negócio que lhe rendeu R$ 181,3 milhões.
O curioso, entretanto, reside no fato de Alckmin, atual governador, ter comparecido ao evento. Discursou, distribuiu sorrisos e tirou fotografias na cerimônia de gratificação de uma das mais graúdas integrantes do cartel de trens e metrôs de São Paulo, notória ainda pela prática de suborno.
Não faltam vestígios da ligação da Alstom a atos ilícitos no Brasil. Seus executivos foram denunciados criminalmente pelo MP-SP e indiciados pela Polícia Federal por atuação no “Trensalão”. A própria multinacional já foi penalizada pelo mesmo órgão, que em dezembro determinou a extinção de sua subsidiária brasileira, junto às de outras nove companhias envolvidas no mesmo esquema, além da devolução aos cofres públicos de R$ 418,5 milhões relativos ao período de 2000 a 2002.
A presença de Alckmin no evento levanta reflexões. Uma delas, acerca da influência do poder econômico sobre o poder público. Só alguém que opera segundo essa lógica pode acreditar que não há nada de contraditório em ir a evento no qual é homenageada uma das corporações responsáveis pelo maior escândalo recente de corrupção do estado que governa. Vale ressaltar que a assessoria de imprensa de Alckmin, a princípio, negou à reportagem do SPressoSP que ele estaria presente na cerimônia. Sua presença só foi confirmada após a celebração, e, mesmo assim, a equipe não conseguiu ter acesso à íntegra de seu discurso à ocasião.
A mídia tradicional, em parte financiada por esses mesmos gigantes corporativos, também não chama a atenção para o fato. Claro que entra na conta a simpatia por determinado grupo político, mas também é interessante notar como pessoas físicas ou políticos envolvidos em escândalos são alvo de parte da imprensa enquanto grandes empresas passam muitas vezes ao largo do noticiário ou são mencionadas de forma quase protocolar, sem juízos de valor ou adjetivações.
É importante lembrar ainda que, entre os três primeiros colocados na disputa pelo governo do estado em 2014, Alckmin, reeleito em primeiro turno, foi quem mais se beneficiou com doações das corporações investigadas no “Trensalão”: segundo matéria do jornal O Globo, treze delas lhe doaram 33% dos R$ 40,3 milhões arrecadados durante sua campanha eleitoral.
Não se trata de acusar o governador de conivência ou algo do gênero, mas sim de compreender o quanto o financiamento empresarial de campanhas eleitorais é algo pernicioso à democracia. Há esforços para acabar com essa modalidade de custeio – como, por exemplo, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) do Conselho Federal da OAB no Supremo Tribunal Federal (STF), da qual o ministro Gilmar Mendes pediu vistas há quase um ano e insiste em não devolver. O processo está travado no STF, enquanto o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, e seu partido, o PMDB, tentam aprovar uma reforma política às avessas, totalmente alheia às reivindicações de estudiosos e movimentos sociais, que mantém as doações de empresas privadas a candidatos.
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