Fascismo

O culto à morte (Por Durval Ângelo)

No Brasil 247

Estarrecido, assisti às cenas da manifestação do último sábado na típica cidade sulista norte-americana Charlottesville. Inspirados pela Ku Klux Klan, ultraconservadores gritavam a “supremacia branca”. De cunho racista, o ato explicitou também o nacionalismo exacerbado, a violência e a intolerância: elementos que, amparados na política, embalaram o nazifascismo na Europa nas décadas de 20 e 30, levando à tragédia da Segunda Guerra Mundial, com 60 milhões de mortos.

O ocorrido em Charlottesville não foi um episódio isolado, mas a expressão de um movimento que se alastra pelo mundo: o neonazismo. Não muito diferente do passado, ele caracteriza-se pelo imperialismo, pelo autoritarismo, pelo ódio étnico, racial e de classes, pelo desprezo às minorias, às diferenças e aos vulneráveis, bem como pela “indústria da morte”. Tal movimento foi decisivo na vitória de Trump nos EUA, o que explica a posição titubeante do presidente frente ao conflito.

Não é preciso ir longe para comprovar a volta ao passado. Como já disseram alguns, “Charlottesville é aqui”. Basta ver o que tem sido feito de nossa democracia, sempre a primeira vítima do nazifascismo. Se Hitler fechou o Parlamento e extinguiu os partidos políticos – inclusive a social-democracia que o apoiava –, aqui, uma presidente eleita foi alijada do cargo, e o governo ilegítimo compra descaradamente o apoio do Congresso. Tudo isso diante de uma população controlada pela propaganda, que encobre a real motivação do golpe patrocinado pelo imperialismo norte-americano.

Agora, a criatura ameaça devorar o criador. A social-democracia brasileira, com o PSDB e seus satélites, está sendo engolida pela ultradireita fundamentalista. Na disputa com Lula, emerge Bolsonaro, que, como Hitler, fala em nome da pátria, da família e das tradições, em um abismo entre o discurso e a prática. Com frases como “o erro da ditadura foi torturar, e não matar”, incorpora o neonazismo brasileiro e empolga setores desesperançados de nossa população. Confrontos e linchamentos são somente algumas expressões desse “culto à morte”. No Rio de Janeiro, recentemente, um refugiado sírio foi brutalmente agredido por ambulantes, aos gritos de “saia do meu país”.

Ao refletir sobre o nazismo, em “Origens do Totalitarismo”, a filósofa Hannah Arendt alerta: “A desvairada fabricação em massa de cadáveres vivos, o incentivo e, o que é mais importante, o silencioso consentimento a tais condições sem precedentes resultam daqueles eventos que, num período de desintegração política, súbita e inesperadamente tornaram centenas de milhares de seres humanos apátridas, desterrados, proscritos e indesejados, enquanto o desemprego tornava milhões de outros economicamente supérfluos e socialmente onerosos. Por sua vez, isso só pôde acontecer porque os direitos do homem, apenas formulados, mas nunca filosoficamente estabelecidos, apenas proclamados, mas nunca politicamente garantidos, perderam, em sua forma tradicional, toda a validade”.

Qualquer semelhança não é mera coincidência.

Durval Ângelo é Deputado Estadual de Minas Gerais

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