Pescado do www.estado.rs.gov.br
Qual o destino do Estado e quais as ideologias que se confrontam, no atual debate sobre as reformas? O debate vale a pena? Creio que sim, ele é educativo e retoma o diálogo sobre as funções públicas de Estado e o futuro imediato dos gaúchos.
Os funcionários que percebem altos salários no RS – e os conquistaram legitimamente – contribuem com a mesma alíquota dos demais servidores, de salários médios e pequenos, para o orçamento que mantém as suas remunerações intactas, quando passam para a “folha dos aposentados”. Mesmo assim, levam para a inatividade os valores que muitas vezes passam de R$ 20 mil, para o resto das suas vidas. Não são incomuns aposentadorias precoces. Como as contribuições são as mesmas para todos, os que percebem pouco e contribuem com a mesma alíquota estão subsidiando as aposentadorias dos altos salários e as suas pensões. Esta é a essência do debate atual.
A aliança política que se formou, neste momento – do corporativismo formalmente “esquerdista” (direitista, na essência, por militar contra a sustentabilidade da previdência pública), com as organizações sindicais do funcionalismo altamente remunerado – embora seja uma prerrogativa democrática, não pode ficar encoberta pelo véu ideológico de que esta aliança representa uma posição popular e democrática, em “defesa da sociedade”. Ela expressa, na verdade, a submissão da extrema esquerda política ao corporativismo economicista, que defende uma social-democracia sem fundos públicos, baseada no privilégio e calcada no prejuízo aos direitos da maioria. Uma social-democracia de privilégios sustentada por 82% dos servidores e pelos que não são funcionários públicos: aqueles que estão inscritos no regime geral da previdência e que pagam os impostos que, aqui no Brasil, como se sabe, são altamente regressivos.
Para isso não hesitam em transitar inverdades, com maior naturalidade: acusam que a formação de um Fundo Público é privatizante, esquecendo que esta reforma já foi feita na prefeitura de Porto Alegre, quando eu estava à frente do Executivo, com o apoio dos servidores e de todos os partidos, e que salvou o sistema previdenciário municipal público do caos e da má gestão; tentam iludir os servidores de salários mais modestos de que a reforma é contra eles, quando, na verdade, categorias que estão na base do sistema – como os professores e os servidores da segurança pública – é que não pagarão um tostão a mais e assim deixarão de subsidiar as altas aposentadorias.
Alguns chegam a dizer que o governo é “neoliberal”, mas estabelecem, na Assembleia, um sistema de alianças que tem o apoio especialmente nos partidos que estiveram no centro (não na periferia) de todas as reformas privatizantes e “liberais” que o Estado sofreu desde a “era Britto” e que nos levou a esta situação crítica em termos financeiros, não enfrentada por falta de condições ou de coragem, por nenhum governo até agora; alegam “falta de diálogo”, mas, na verdade, querem é impedir a votação das reformas, sem apresentar qualquer proposta alternativa, omitindo que esta discussão existe no Estado há mais de 20 anos.
A agenda do atual governo remete principalmente para o destino dos direitos conquistados pelos servidores – mantê-los com sustentabilidade – e para uma “utopia concreta”, como diria Ernst Bloch. A utopia de viabilizar os direitos de todos “aqui e agora”: para as próximas décadas. Sem assistir passivamente, como fizeram os socialistas gregos e portugueses, à decadência do Estado capturado por corporativismos subsidiados por toda a sociedade, pelos servidores de salários mais modestos, ou capturado pela tutela do capital financeiro, que transforma o Estado endividado – no momento em que a crise estoura – num ajoelhado devoto das receitas de cortar políticas sociais, salários, aposentadorias e investimentos. É isso que queremos evitar. Sem raiva e sem medo.
(*) Tarso Genro
Governador do Estado
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SERVIDORES LUTAM PELOS SEUS DIREITOS
O Estado democrático pressupõe o amplo debate com a participação da sociedade. O governo recusa a discussão e quer aprovar em regime de urgência as suas propostas. Nem audiência publica aceitou. Usar o poder do Estado para retirar direitos dos servidores não pode ser chamado de democrático e justo.
O debate democrático é essencial para a sociedade superar as suas dificuldades. Adjetivar para não discutir o mérito das propostas e acusar os outros dos atos que pratica é inaceitável. A acusação de “corporativismo formalmente ‘esquerdista’ (direitista, na essência, por militar contra a sustentabilidade da previdência publica)” não procede já que é o projeto governamental que aprofunda a insustentabilidade da previdência. Por oportuno, julgamos importante destacar que não há ações contra a regressividade dos impostos, para reduzir benefícios fiscais, nem para combater a elevada taxa de juro.
A retirada de direitos está presente nos projetos em debate, senão vejamos:
PLC nº 189/11 – Dividir os servidores com segregação de massas e criar o regime de capitalização agravam os problemas da previdência estadual. O passivo previdenciário é dívida do Estado, inexistindo o alegado déficit. As contribuições que deveriam ajudar a pagar as aposentadorias e pensões serão aplicadas no mercado com todos os riscos da especulação financeira. O regime de capitalização eleva o gasto e rompe com o princípio da solidariedade entre as gerações fundamental à previdência pública. Além disso, não tem plano de benefícios, plano de custeio, cálculos atuariais, nem definição clara de gestão. O art. 40, § 20 da Constituição Federal veda a existência de mais de um regime próprio no Estado.
A progressividade na contribuição dos servidores, a cobrança no mesmo ano em que é aumentada e o caráter de confisco estão vedados pelo art. 150 da CF, II; III, b; e IV.
O reconhecimento de que o Regime Próprio Previdência dos Servidores do RS não está organizado conforme a lei não é suficiente, cabe ao Estado regulamentar. Bem como, se exige o gestor único (art. 40, § 20 da CF) e a gestão paritária (art. 41, § 1º da CE). Além de garantir a regulamentação da aposentadoria especial prevista na CF e a previsão de reajuste para os aposentados por invalidez através de lei estadual, entre outros direitos previdenciários não cumpridos pelo Estado.
PL 191/11 – Adiar o pagamento dos RPVs devidos a servidores é responsabilizar os baixos salários pela crise das finanças. O governo não cumpre a lei, depois de condenado pela justiça busca meios inconstitucionais de adiar o seu pagamento (art. 100, § 3º da CF e art. 97, § 12 do ADCT da CF). Além disso, não cumpre o discurso da campanha de agilizar o pagamento de precatórios e RPVs.
Nos 50 anos da Legalidade se quer revogar dispositivo constitucional federal através de lei estadual. Os servidores lutam pela superação das dificuldades da previdência. A ratificação da Convenção 151 da OIT pelo Brasil não foi suficiente para a negociação coletiva se tornar realidade para os servidores gaúchos.
Claudio Augustin
Presidente do SINDSEPE/RS (Sindicato dos Servidores Públicos do Estado do RS)
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Caro Claudio
Não sou um expert em Previdência. Por outro lado, não posso concordar contigo quando dizes que o passivo previdenciário não se caracteriza em déficit por que dívida do estado. Que é dívida do estado não há dúvida, tanto é, que parcela significativa de recursos do estado vão para pagar esta conta e deixam de ser usados para investimentos que são tão necessários quanto manter um número cada vez maior de servidores na ativa para bem atender a população. Então é preciso sim buscar solução para a previdência. Quando a dívida é do Estado, ela onera o povo, que paga impostos e que acaba tendo menos serviços, pois os recursos são usados para pagar as tais dívidas que nunca são para o todo mas para parte, as vezes, muito pequenas do Estado, como estes que recebem salários significativos, quando não polpudos, como no caso do judiciário e que são aqueles que de fato pagarão uma aliquota de 14%. Por outro lado, o formato adotado para o futuro da previdência no Estado é similar ao adotado em Porto Alegre, e sobre o qual não se ouvem queijas dos servidores municipais, nem os da ativa, nem os inativos. Posso deduzir desta ausência de queixas que o regime é bom e funciona bem para ambos.
Argumentações com oas que usas foram usadas também para atacar a Reforma da Previdência desenvolvida nos primeiros anos do governo Lula. Na verdade muito poucos tiveram sua contribuição ampliada e a grande maioria, aquela que depende desta previdência pública e ganha menos, passou a ter a futura aposentadoria garantida na integralidade. Integralidade aliás, que não é permitida aos trabalhadores da iniciativa privada. A corporação de servidores, ao se constituir assim, em corporação mesmo, foi se afastando dos interesses do conjunto da sociedade e em especial da classe trabalhadora, que sofreu muito piores ataques nos seus direitos previdenciários do que o servidor público. Aliás, para os trabalhadores da iniciativa privada é uma injustiça que o Servidor Público tenha direitos que ele, trabalhador da iniciativa privada não tem. Talves, se o Servidor público não tivesse aceito o subir ao pódium inalcançavel para a maioria dos trabalhadores e tivesse ficado na pista enquanto os trabalhadores da iniciativa privada perdiam a corrida para o neo-liberalismo emergente então, talvez agora a história estivesse sendo contada de outra forma. De toda sorte, assim como o governador, acredito numa sociedade mais justa que se concretiza na utopia possível, para termos a possibilidade e as forças necessárias para avançar em direção a utopia verdadeira. Por esta razão reproduzi aqui no Blog o texto do Governador. Mas por compreender que a democracia é sempre o espaço para o debate do contraditório, reproduzi também teu texto e terei prazer de reproduzir tantos quantos forem enviados.
Abraços
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