As manifestações de rua ocorridas no mês de junho em importantes cidades brasileiras, principalmente nas capitais dos estados, passaram a exigir da sociedade em geral; e deste Parlamento, em particular, uma profunda reflexão sobre os recentes acontecimentos, especialmente quanto aos anseios sociopolíticos ecoados das ruas, o descontentamento com a representação dos partidos políticos e os questionamentos direcionados aos governos, à grande mídia, as corporações hegemônicas e ao sistema financeiro.
Some-se a isto o alvorecer de um novo tempo, onde a utilização das sempre inovadoras e modernizantes ferramentas de interatividade social, propiciadas pelo uso maciço da internet, converteu-se em instrumento de expressão política.
Estamos diante da era da comunicação on-line, do acesso universal e irrestrito de informações, até muito recentemente indisponíveis ao conjunto da sociedade, e que agora, além de fonte de entretenimento e informação passa também a ser utilizada como meio de sociabilidade, via compartilhamento informativo. Nunca antes, conteúdos dos mais variados assuntos e interesses, estiveram à disposição de um número cada vez mais amplo de pessoas.
Antevendo este novo mundo, prenunciado nas mobilizações de massa da Primavera Árabe de 2011, o pensador e ensaísta uruguaio, Eduardo Galeano sentenciou: “O mundo está grávido de um outro mundo”.
Desvendar que mundo é este que se descortina diante dos nossos olhos; compreender os anseios, sonhos e ambições que dele afloram compreendem missões primordiais da política contemporânea.
Se de fato desejamos o aperfeiçoamento das instituições democráticas, cumpre ao Parlamento o papel interpretativo dos fatos recentes para melhor, e mais adequadamente, representar aos estímulos, reivindicações e necessidades que hoje emergem das ruas.
Este ágil fenômeno sociológico de comunicação e mobilização digital, que se apropria da disseminação do uso internet para em seguida ganhar as praças e ruas, trouxe reconhecimento público aos ciberativistas, uma nova categoria de manifestantes, que se expressa livremente pelas redes sociais sem necessariamente a mediação direta da mídia tradicional; ainda que, eventualmente, por adesão ou repulsa, muitas vezes replicam os conteúdos noticiosas e editoriais do jornalismo profissional.
Por vias transversas, a internet e a Cibercultura vão, reflexamente, pavimentando o até então inimaginável caminho para uma inusitada espécie de controle social da grande mídia, retirando-lhe gradativamente o monopólio da informação gerada e difundida.
Este novo ativismo que meritoriamente soube se apropriar das potencialidades tecnológicas da rede mundial de computadores, também se consolida em uma tendência global e sem fronteiras de expressão da cidadania.
Antes mesmos das manifestações de junho no Brasil, grandes mobilizações populares pelo mundo já haviam utilizado este mesmo estímulo convocatório para mobilizações de massas: do movimento Ocuppy Wall Street de dois anos atrás aos manifestos transnacionais de países do mundo árabe por liberdade e democracia; das ocupações de praças públicas em Lisboa, em reação as medidas de austeridade consumadas pelo governo português até as recentes passeatas de Dublin (na Irlanda) e Montreal (no Canadá); da ampla rede de solidariedade que se constituiu em favor da greve geral contra o desemprego, organizada por trabalhadores de Madrid, Sevilha e Barcelona, na Espanha a gigantesca reação popular à descaracterização original do maior parque público do centro de Antara (na Turquia), chegamos, nos últimos dias, ao surpreendente levante popular do Egito, que menos de dois anos após a deposição do ditador Hosni Mubarack, novamente em praça pública, destitui o governo do presidente Mohamed Mursi.
Um dos maiores especialista da contemporaneidade em comunicação midiática, o sociólogo espanhol Manuel Castells definiu esta tendência de interação digital informativa como fenômeno de “autocomunicação de massas”, onde a moderna tecnologia (em especial as redes sociais) foram descobertas como eficazes ferramentas de aglutinação de idéias e de sentimentos.
Talvez, alerta Manuel Castells, estejamos, neste exato momento, vivenciando o surgimento de uma nova formatação do conceito formal de democracia: mais participativa, mais interativa e ainda mais popular.
Se existem muitos pontos em comum entre as diferentes manifestações públicas ocorridas recentemente no mundo, todas impulsionadas pelo poder das redes sociais, não podemos desprezar as peculiaridades motivacionais que deram origem às mobilizações em cada um dos países onde se verificou tal fenômeno.
No Brasil, as mobilizações convocadas pelas redes sociais, surgem inicialmente em reação ao aumento no valor das passagens dos ônibus e por melhorias na qualidade dos serviços públicos de transporte oferecidos à população.
Curiosamente, antes mesmo de sua conversão em onda nacional, a cidade de Porto Alegre já protagonizava manifestações de rua, aglutinando usuários sob o mesmo binômio da qualidade e do preço dos transportes públicos.
A fagulha que transformou um movimento de justas e legítimas reclamações pontuais em uma ampla mobilização reivindicatória, replicada nas principais cidades do país, foi potencializada pela ressonância das redes sociais, em proporção e velocidade múltiplas, galvanizando adesões sequenciais reverberadas em praças, ruas e avenidas.
A reação inicial: agressiva e desproporcional da polícia militar do estado de São Paulo, buscando dispersar o movimento com bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo, prisões arbitrárias e balas de borracha disparadas contra manifestantes, teve o condão de estimular adesões solidárias na sociedade, instigar acirramentos às manifestações seguintes e impulsionar mobilizações Brasil afora, já que problemas de transporte viário e mobilidade urbana passaram a representar uma insatisfação constante no cotidiano das metrópoles brasileiras.
A cada nova manifestação, outros reclames passaram a se associar às críticas do caos no trânsito: déficit de infraestrutura, precarização nos serviços públicos; mais investimentos em Saúde, Educação, Segurança Pública; maior transparência nos poderes da República, críticas ao sistema político representativo, maior transparência e eficiência na gestão dos recursos públicos, entre outros. Foi assim que um elo espontâneo entre descontentamentos e reivindicações até então desconectados foi-se formando entre os manifestantes mobilizados por motivos distintos.
Fato em comum em nossas grandes cidades é que trabalhadores brasileiros encontram-se submetidos as mais variadas pressões e provações em suas vidas diárias.
No mercado de trabalho, cada vez mais complexo e exigente, cobranças são crescente por melhor desempenho e produtividade; exigências de formação e capacitação profissional, adesão a processos de qualificação e requalificação tornaram-se condicionalidades ao acesso, permanência e ascensão no competitivo universo formal de trabalho.
Ao reverso, e ao mesmo tempo, aqueles que fazem uso regular de transporte público nas grandes cidades sentem-se reféns de um serviço vital e insatisfatório para seus deslocamentos diários.
Desproporcionalidade entre o preço da tarifa cobrada e a qualidade dos serviços oferecidos; a quase inexistência de alternativa modal ao transporte rodoviário; deterioração e obsolescência das frotas, atrasos constantes nas viagens; superlotação em horários de pico; congestionamentos, cada vez mais extensos e frequentes, e ausência de corredores viários exclusivos para ônibus que, ao menos minimizem o desconforto de longos e exaustivos deslocamentos; são queixas mais que frequentes.
Estudo produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e divulgado durante a realização de Comissão Geral promovida na última terça-feira pela Câmara dos Deputados, sinaliza no mesmo sentido: O Poder Público deve ser mais eficiente na gestão do serviço público de transporte.
Documento denominado ‘Tarifação e financiamento do transporte público urbano’ é taxativo:
“O modelo adotado, de financiamento da operação quase que exclusivamente via arrecadação tarifária, praticado em todos os municípios, mostra-se inadequado no objetivo de se alcançar um transporte público de alta qualidade e baixo custo para o usuário.
(…)
Contudo, é importante ressaltar a importância de se ter uma gestão municipal dos serviços devidamente capacitada com adequados modelos de regulação das tarifas. Sem a satisfação dessa condição, qualquer tipo de subsídio a ser adotado poderá não alcançar plenamente seus objetivos”
Para além dos graves problemas de trânsito viário, também por uma democracia mais participativa, passaram a ecoar os brados das ruas, revelando um descontentamento com a gestão dos serviços públicos, a baixa produtividade dos parlamentos, a morosidade da Justiça, o afastamento dos partidos políticos da vida comum das pessoas, o distanciamento da agenda legislativa dos temas de maior relevância e impacto no cotidiano das cidades, bem como a insatisfação com o monopólio da mídia e da informação.
Se há, como se observa, graves problemas na vida urbana, a exigir investimento, planejamento, aprimoramento de gestão e logística na prestação de serviços públicos essenciais; da mesma maneira, a constatação de crise do sistema representativo deve emitir sinais na direção de seu aprimoramento e não simplesmente apostar na sua fácil extinção; como, aliás, sempre propõem os regimes autoritários ao serem guindados ao poder. Em regra, este vaticínio arbitrário não se ampara em afeições ou simetrias aos sentimentos do povo; mas sim, em interesses inconfessáveis de eximir-se da crítica; de tensões, contraditórios e questionamentos.
O Parlamento é por natureza o espaço de manifestação das vontades populares. O mais genuíno campo de interlocução do povo com a esfera pública. Compelido pelas urnas, nenhum outro poder é mais comprometido com o sentimento das ruas do que o Legislativo.
Há, portanto, que se questionar: Existiria democracia sem a presença de partidos políticos?
O filósofo italiano Norberto Bobbio, um dos maiores pensadores do século XX, já alertava para a importância das instituições políticas para o fortalecimento da democracia: “Só as instituições democráticas, aquelas que chamam o maior número possível dos cidadãos à responsabilidade do poder são capazes de evitar a corrupção dos homens”.
Nada mais falso e ingênuo do que a crença na desmoralização da democracia representativa para se atingir a depuração da vida pública.
Aliás, somente a democracia representativa possui a legitimidade para promover e ampliar as modalidades de sufrágio, de participação popular e aprimorar o controle social sobre a vida pública do país.
O povo clama por maior aproximação e identidade dos Poderes da República com seus sentimentos e anseios.
Quem seria então a legítima interlocução deste desejo, manifesto nas ruas e fortemente presente nas redes sociais?
Essencialmente não haveria de ser o Poder Judiciário, que por subordinação à Constituição e as leis da República não deve e nem pode moldar sua conduta aos anseios da sociedade, sob pena de colocar em risco a segurança jurídica, os direitos e garantias fundamentais da própria sociedade e a estabilidade da ordem constitucional.
Não cabe ao Judiciário, senhor da resolução de litígios e de conflitos de interesse, afastar-se dos fundamentos constitucionais para ceder às pressões, independentemente de onde se origine, inclusive dos anseios do povo.
Tampouco, caberia tal missão, ainda mais em regimes presidencialistas, ao Poder Executivo; pois este é o promotor da gestão pública, das definições administrativas, da iniciativa e da execução orçamentária, além de deter o protagonismo da agenda política.
Pertence, por óbvio, ao Parlamento, o papel de dialogar, interpretar, traduzir e transformar em realidade normativa, pela via legislativa, os anseios democráticos da sociedade.
Diferentemente dos regimes totalitaristas, a democracia não alimenta a ambição da unanimidade. Ao contrário: preserva a diversidade, respeita a existência e os direitos da minoria, mas legitima-se pela vontade soberana da maioria, expressa livremente pelo povo e representada pelo Parlamento.
A saída, repito: não está na abolição dos partidos políticos. Não está na substituição da democracia representativa, mas sim na promoção de um novo modelo operacional que venha a consagrar uma sintonia direta, periódica e ágil entre os partidos e os interesses da sociedade, que em sua diversidade de composição política e ideológica encontre a agremiação de sua identidade.
A democracia continua sendo berço e inspiração para qualquer avanço civilizatório; seja no mundo real ou no espaço de conclaves virtuais propiciado pelas novas tecnologias.
Ademais, não existe cenário possível para ampliação e consolidação de direitos sociais sem a presença primordial do Estado.
Aclamado nos anos noventa (90) por grandes mercados, conglomerados econômicos e por governos de índole liberal-conservadora pela defesa triunfante e inexorável do Neoliberalismo, o cientista político nipo-americano Francis Fukuyama, em sua mais recente produção acadêmica: “As origens da Ordem Política”, lançado recentemente no Brasil, dobra-se finalmente à importância do Estado, já que somente por instituições políticas estáveis, inclusivas e pacíficas, seríamos capazes de reduzir os níveis de corrupção e, ao mesmo tempo, elevar o grau de deferência às liberdades individuais, colaborando na construção de um modelo civilizatório equilibrado e próspero; como se almeja atingir nas democracias do século XXI.
Os seres humanos de todo o planeta são iguais em dignidade e em sonhos de liberdade, segurança e prosperidade. Contudo, encontram-se submetidos a realidades nacionais distintas e peculiares.
Naturalmente, os estímulos e insatisfações que geraram grandes mobilizações de massa pelo mundo, todas impulsionadas pelo fenômeno da internet, não detêm as mesmas características. As motivações da juventude dos países árabes, da Europa e do Brasil não são, evidentemente, as mesmas.
No mundo árabe luta-se hoje pelo reconhecimento humano à individualidade de crenças, de gênero, de identidade e de convicções. Forças se unem pelo arejamento democrático, pelo fim da censura e do cerceamento de Estado. Busca-se essencialmente a liberdade: individual e coletiva.
Em países europeus as mobilizações possuem motivações econômicas. O desemprego nos dezessete (17) países que integram a zona do Euro alcançou, nos últimos meses, nível recorde! 12,1% da população economicamente ativa encontra-se fora do mercado de trabalho. Há incertezas quanto ao futuro e crise de esperança entre os jovens. Países tradicionais como Itália, Grécia e Espanha registram índices de desemprego ainda mais críticos: 12,2%, 26,8% e 26,9%; respectivamente.
O que merece reflexões mais profundas são as manifestações ocorridas no Brasil.
Na última década ocorreram muitos avanços no país: Dezenove (19) milhões de empregos formais foram criados, atingimos ao menor índice de desemprego dos últimos cinquenta (50) anos, Houve melhoria na renda, Quarenta (40) milhões de pessoas ascenderam à classe média inaugurando uma nova formatação da sociedade brasileira.
Superamos a clássica representação piramidal que ilustrativamente revelava o caráter hierárquico e desigual na distribuição da riqueza nacional. Ampliaram-se as condições de acesso à universidade para as classes trabalhadoras.
Sim: Ainda existem barreiras de desigualdade a serem superadas, mas as melhorias desta década foram reconhecidas por organismos de representação internacionais insuspeitos, como a OIT e a FAO.
Estamos nos aproximando da extinção da miséria absoluta no país!
Mas, com tantos indicadores positivos, há que se reconhecer um ponto de convergência no descontentamento dos brasileiros:
No contexto da vida urbana, onde atualmente residem 85% da população houve um decréscimo na qualidade de vida das pessoas, facilmente perceptível na ineficiência dos serviços públicos essenciais.
Foi por melhoria no transporte, na saúde, na educação, na segurança pública; no planejamento urbano, enfim, é que manifestantes foram às ruas e erguem suas bandeiras.
Há uma curiosa razão para que no amplo elenco de direitos sociais reivindicados, não se tenha ouvido nenhuma manifestação em busca do direito de moradia.
Historicamente negligenciado, inauguramos em 2009 o mais audacioso programa habitacional da história deste país. Desde então, mais de um milhão e duzentas mil (1.200.000) novas moradias foram entregues pelo programa ‘Minha Casa Minha Vida’, contemplando todos os estados da federação. Estima-se que aproximadamente quatro milhões (4.000.000) de pessoas tenham sido diretamente beneficiadas. A eloquência dos números, por si só, é suficientemente reveladora da negligência histórica e de nosso vergonhoso déficit habitacional, que impedia um enorme contingente de brasileiros e brasileiras ao acesso elementar a um direito humano primordial: o direito de morar.
Em comum, o grande entrave nas metrópoles brasileiras para a viabilização deste extraordinário programa social tem sido a indisponibilidade de terrenos urbanos, apropriados para a construção de empreendimentos habitacionais populares.
Pagamos hoje o preço de um modelo ocupacional segregacionista, que determinou o perfil e o desenvolvimento espacial das grandes cidades brasileiras; onde o território urbano, melhor provido de localização, bens e serviços foi estrategicamente monopolizado por conglomerados econômicos, grupos financeiros, segmentos imobiliários privados e por setores especulativos.
Neste contexto, restou a população pobre e marginalizada, primeiro o ambiente insalubre e inóspito dos cortiços, depois o espaço precário e informal das favelas. Muitas delas erguidas em áreas de risco real ou iminente. Por fim, as franjas urbanas: distantes regiões periféricas, cuja população, em busca de trabalho, educação, saúde e convívio em parques ou praças públicas obriga-se a exaustivos deslocamentos.
Esta realidade passa a demandar a justa presença de infraestrutura e de serviços públicos essenciais como escolas, postos de saúde e condições dignas de mobilidade a unir o entorno ao centro da cidade.
É nesta realidade que a internet passa a exercer papel estratégico para vocalizar os sentimentos e as agruras da população, especialmente seu segmento mais desprovido de atenção e investimento público.
É verdade que os ágeis mecanismos de comunicação viabilizados pela internet, ao promoverem a livre circulação de informações e opiniões, representam estímulos novos para a expressão e mobilização da sociedade civil.
No entanto, esta compreensão não pode e não deve ser interpretada como estágio inaugural de superação de uma suposta letargia do povo brasileiro na defesa de seus direitos e interesses. A frase replicada em diversas manifestações de rua e nas redes sociais: “O gigante acordou” não faz jus à história de lutas de nossa sociedade.
Muito antes dos atuais acontecimentos, e não necessariamente ao revés das últimas mobilizações, demonstrações de vitalidade, de autonomia organizacional em relação aos partidos políticos e de capacidade de mobilização poderiam facilmente ser identificadas em forças vivas e atuantes da cidadania como é o caso do Grito dos Excluídos; da Marcha das Margaridas, (protagonizada todos os anos por trabalhadoras rurais de todo o Brasil) e das Paradas Gays (que a cada novo ano amplia sua presença pelas ruas das cidades brasileiras).
Com pautas reivindicantes da efetivação de direitos sociais, por ações afirmativas e maior sintonia da agenda política com os anseios da sociedade, nada supõe o distanciamento entre estas iniciativas citadas e as principais motivações que, agora, conduziram milhões de manifestantes aos espaços públicos de convivência de nossas cidades.
Talvez o mais evidente diferencial seja mesmo a descoberta do potencial mobilizador da internet como ferramenta indutora ao exercício da cidadania.
Sim: Aportamos no tempo da comunicação social imediata. Ou, se preferirmos: da “autocomunicação de massas”, no dizer de Manuel Castells: de alto padrão tecnológico, de acesso cada vez mais democrático e de transformação de consumidores de informação em geradores de notícias de seu próprio interesse.
A manifestação cibernética da sociedade será cada vez mais frequente nas modernas democracias de massa, interferindo na qualidade e nos rumos do debate político.
Porém, isto não significa supor que a internet e as redes sociais serão capazes de substituir o sistema político representativo, conduzindo-nos ao decantado paraíso da democracia direta.
A beleza, a essência e a imprescindibilidade da democracia representativa residem justamente na sua pluralidade; na convivência entre contrários e na busca incessante de consensos, capaz de regrar, com justiça e eficiência, o convívio social.
É fato que o preço do diálogo, do exercício argumentativo, do acolhimento da réplica e da busca do convencimento, naturalmente demanda esforço, disposição e tempo.
Provavelmente, um tempo maior que o da ansiedade que exige soluções instantâneas. A ideia de que decisões imediatistas possam responder melhor a questões de alta complexidade é ingênua e ilusória.
A democracia possui a ritualística da pluralidade, e esta se expressa nas vozes do Parlamento.
Aqui, não deletamos convivências que nos sugerem adversas ou inoportunas. Não selecionamos exclusivamente a postagem de imagens e informações que confortavelmente nos favoreçam. Ao contrário, expomos diariamente as nossas contradições para a sociedade, pois é justamente do convívio de nossas diferenças que retiramos o oxigênio de nos dá sobrevivência.
Nossas portas são amplas e estão permanentemente abertas. Sabemos que a originalidade que nos distingue dos outros poderes reside em submetermo-nos cotidianamente à avaliação crítica do país que periodicamente nos chancela a delegação para a defesa dos interesses da pátria e da cidadania.
Numa democracia a construção de solução para os problemas da vida real é atribuição indeclinável da política. Não há política sem agremiações partidárias, sem partidos políticos.
Isto não significa dizer que os sistemas eleitoral e partidário brasileiro não necessitem de urgentes aprimoramentos. Este é um claro recado das ruas!
Que a energia e a força mobilizadora das recentes manifestações nos inspirem na qualificação cívica dos poderes da República e, de modo especial, do trabalho desempenhado por seu melhor intérprete: o Poder Legislativo.
Que por este caminho, possamos avançar em progressão e sintonia com a vontade popular: para o fortalecimento contemporâneo da democracia e para o bem maior do Brasil.
PAULO FERREIRA – Deputado Federal do PT/RS
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